(Os origami que D. Raimonda estará condenada a fazer até ao fim dos tempos, enquanto D. Ramiro mofa e amofina na nave dos loucos.)
... por vezes D. Ramiro e D. Raimonda se encontravam no jardim das glicínias, ou sob um caramanchão ocupado por pombos infectos com h5n1. Falavam sobre o devir e como o presente se esgaçava entre compras pertinentes em lojas orientais e de papéis vários. D. Raimonda, salvo os excessos que cometia em longos passeios rodopiantes pelo carrossel (montada num ginete com meio metro de altura), se deleitava com os arrufos de D. Ramiro que fazia projectos a médio e longo prazo. Segundo ele, deveria dar entrada no Conde Ferreira acompanhado por seu fiel Mestre Piolo, com três caixas de arquivo por fazer, um cravo devidamente equipado com alguém que o soubesse manobrar, cinco criados de libré e o incenso necessário para queimar durante as longas noites naquele hospício. A demência era inevitável. D. Raimonda, desesperada, brandia os braços, empunhando o frasquinho de lítio e gritando: "Nóis si salvará, nóis si salvará". Em vão. A cena pungente, digna de um naufrágio e meio, dois Camões e Edgar Allan Poe bebâdo, faria chorar o mais cruel dos juízes. Mas D. Ramiro, virando dramaticamente a sua face na direcção oposta à da histérica Raimonda revia, qual filme de Manoel de Oliveira, toda a vida de ambos. Não havia momento que não fosse literalmente uma insanidade. D. Raimonda cai e o pano também. Haverá salvação?
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